O soldado de 19 anos, que denunciou ter sido agredido no 13º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Pirassununga (SP), ainda sofre com ataques de pânico e ansiedade ao lembrar da violência, segundo relato do advogado dele, Pablo Canhadas.
"[Ele sente] o corpo gelar, tem dor de barriga e pensamentos ruins", afirmou Canhadas. A defesa disse que ele ficou 'aliviado' com a expulsão dos seis militares suspeitos da violência, mas não deve voltar às atividades militares.
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O jovem foi agredido com remo de panela industrial, pedaços de ripa de madeira e teve a farda arrancada e uma vassoura quebrada na região do ânus.
Os suspeitos vão responder como civis a processo na Justiça Militar da União (JMU). Isso porque, segundo o Comando Militar do Sudeste, "investigados e supostos ofendidos eram militares da ativa na época do fato ocorrido".
Conforme a instituição, o trâmite está previsto no artigo 9º do Código Penal Militar. Por esse mesmo motivo, inclusive, não houve abertura de inquérito por parte da Polícia Civil, informou o delegado Maurício Miranda de Queiroz.
Acompanhamento
Os militares, que não tiveram as identidades divulgadas, não moram na mesma cidade do jovem. "Isso evita que ele tenha que encontrá-los", relatou o advogado.
Segundo Canhadas, o soldado segue em tratamento psicológico e psiquiátrico, com uso de medicamentos antidepressivos e antipsicóticos.
"Ele tem apresentado evolução, aos poucos vai retomando a reinserção social, conseguindo frequentar ambientes mais familiares. Tem sido importante", comentou.
Jovem não deve voltar ao Exército
Apesar desse progresso, o profissional de defesa admitiu que, quando se trata da carreira, o trauma do jovem ainda é intenso.
Na semana passada, quando foi ouvido pela primeira vez no processo na JMU, relatou ao advogado que estar no quartel era motivo de o "corpo gelar", ter "dor de barriga" e "pensamentos ruins".
"Ele não volta para o Exército nunca mais. Pelas atitudes que ele tem no pós-trauma, eu falo que ele dificilmente vai voltar a colocar uma farda. Vai voltar a ser normal? Pode até voltar, dentro da normalidade dele, mas o que aconteceu arrebentou com ele."
O jovem está afastado oficialmente do Exército desde 24 de janeiro, quando passou por uma avaliação médica no próprio 13º RC, em Pirassununga. Conforme Canhadas, o afastamento é válido por 45 dias, mas o soldado deve ser reavaliado no início de março, na Junta Militar, em São Paulo.
O Exército não confirmou a informação sobre a licença médica ao g1. Apenas afirmou que "as informações de saúde são de caráter pessoal e de acesso restrito ao militar em questão".
Expulsão dos militares
Os seis militares investigados por agressão ao soldado do 13º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Pirassununga, foram expulsos do Exército Brasileiro, segundo o Comando Militar do Sudeste.
A vítima, de 19 anos, denunciou que a violência aconteceu em 16 de janeiro, quando estava organizando um espaço dentro do quartel e outros soldados disseram que ele teria que limpar uma câmara fria.
O jovem disse que, ao chegar no local, foi violentamente agredido com diversos objetos.
O g1 questionou a instituição a quais crimes eles vão responder, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
O inquérito policial militar (IPM), instaurado em 20 de janeiro e concluído na última semana, está sob sigilo.
Em nota, o Exército Brasileiro informou que "repudia, veementemente, a prática de maus-tratos ou qualquer ato que viole os direitos fundamentais do cidadão". Na semana passada, o soldado foi ouvido pela primeira vez no processo na JMU.
O g1 tentou contato com as defesas dos militares, mas não tinha conseguido até a última atualização desta reportagem.
Troca de mensagens
A Polícia Civil enviou ao Exército Brasileiro documentos e uma suposta conversa entre o soldado que denunciou agressão e um dos colegas de corporação suspeitos de atacá-lo.
Em uma das mensagens, um militar identificado como cabo Douglas afirmou que a vítima "aceitou a brincadeira".
O g1 teve acesso a um trecho das supostas conversas enviadas ao Exército.
A reportagem questionou várias vezes o Exército se a troca de mensagens faria parte do material da investigação. A instituição, no entanto, respondeu apenas que "foi instaurado um IPM que corre sob sigilo, visando garantir a eficácia da investigação e a elucidação de um crime."
O jovem militar disse à polícia que a agressão aconteceu em 16 de janeiro. Na mensagem, supostamente enviada já no início da madrugada de sexta-feira (17), o cabo Douglas pergunta primeiro se o soldado está bem.
Veja o diálogo abaixo:
Cabo Douglas: "Tá tudo bem com você?"
Soldado agredido: "Bem como se me arrebentaram hoje, uma tortura, não sei nem o que vou fazer da minha vida. Acabaram com a minha vida seus fdp".
Cabo Douglas: "Não fizemos nada com você. Você aceitou a brincadeira".
Soldado agredido: "Brincadeira?"
Cabo Douglas: "Quero nem papo com você. Você aceitou".
Soldado agredido: "Você acha que é brincadeira que fizeram comigo?"
Cabo Douglas: "Você aceitou".
O g1 não conseguiu contato com o cabo Douglas.
Investigação e abalo emocional
O caso foi registrado como lesão corporal no 1º Distrito Policial de Pirassununga. Mas, conforme apurou a reportagem, não houve investigação da Polícia Civil, apenas do Exército.
Em nota, o Comando Militar do Sudeste informou que "o Exército Brasileiro não compactua com qualquer conduta ilícita envolvendo seus integrantes". A instituição informou, inicialmente, que os investigados poderiam ser expulsos, o que de fato aconteceu.
O soldado ficou traumatizado, muito abalado e introspectivo, contou Canhadas. O responsável pela defesa também afirmou que as agressões duraram cerca de 30 minutos.
O jovem relatou que dois colegas o seguraram, enquanto o restante o agredia.
"Neste momento, estamos trabalhando com o que chamo de 'ação de contenção de ônus', é mais um acompanhamento de perto para defender que amanhã ou depois não criem um arcabouço para falar que o meu cliente foi o responsável pelo ato que sofreu dentro do Exército, para poder eximir a União de pagar uma indenização, de dar um suporte psicológico e psiquiátrico. Quem disse que amanhã ele vai estar bem para seguir a vida? Vê farda e já começa a chorar", disse o advogado ao g1 no dia 22 de janeiro.