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Opinião Domingo, 09 de Março de 2025, 06:00 - A | A

Domingo, 09 de Março de 2025, 06h:00 - A | A

CRISTHIANE BRANDÃO

Por que a “voz” feminina importa?

Cristhiane Brandão*

Combater a desigualdade de gênero e empoderar meninas e mulheres é um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) defendido pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU). Mas, afinal, por que essa pauta é tão importante não só para nós, mulheres, como para as empresas e a sociedade?

Primeiramente, acabar com a discriminação é uma forma de combate à violência de gênero. O Anuário da ONU Mulheres, divulgado no final do ano passado, revelou que cerca de 85 mil meninas e mulheres foram mortas intencionalmente em todo mundo no ano de 2023, o equivalente a uma morte a cada 10 minutos. No Brasil, o total de feminicídios chegou a 1,4 mil mulheres neste mesmo período.

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Apesar de consolidado como uma potência econômica, o estado de Mato Grosso infelizmente tem a maior taxa de feminicídios do país, com 2,5 mortes para cada grupo de 100 mil mulheres (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2024). Enquanto estava revisando esse artigo, num grupo do Whatsapp, uma colega estava pedindo ajuda diante de um caso... a violência está mais perto do que enxergamos e, muitas vezes, vem a sensação de impotência, ao mesmo tempo em que, tendo uma rede de apoio, nos sentimos potentes e acolhidas para o próximo passo.

As estatísticas reforçam o discurso do secretário-geral da ONU, António Guterres, que descreveu que “A violência contra mulheres é a pandemia mais longa e mortal do mundo”. Diante desse cenário crítico, políticas públicas que promovam a inclusão de mulheres em espaços de poder são essenciais para potencializar mudanças, pois, mesmo que representem 51,5% da população e 45% da força de trabalho (IBGE, 2022), elas ocupam apenas 38% dos cargos gerenciais.

Apesar de inúmeros avanços, paradoxalmente, lutamos contra estereótipos obsoletos de que mulheres são “emocionais” para cargos de risco ou que incentivar a liderança feminina seria um “favor”. Mas dados do Fórum Econômico Mundial (2023) mostram que, na verdade, esse é um imperativo estratégico: empresas com mais de 30% de mulheres em liderança alcançam lucratividade 21% superior.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2022) também aponta que a diversidade de gênero em conselhos de administração reduz riscos de corrupção e melhora a governança. Mulheres líderes tendem a priorizar políticas de conciliação família-trabalho, inclusão e sustentabilidade, que são temas urgentes em um país com 11 milhões de mães solo (IBGE, 2022).

No campo da governança, por exemplo, a composição dos conselhos, na maioria das vezes homogêneos e masculinos, a tradição de filhos homens sucederem, de mulheres não participarem de questões da empresa e/ou questões societárias, de se fazer ouvida, incluída, e competente de igual para igual, ainda é um desafio. Os caminhos para a transformação? Muita conscientização e mudanças estruturais que suportem o trajeto: cotas, cultura e muita coragem.

Diversos países trilharam esse caminho, entre eles, Estados Unidos, Noruega, Espanha, Finlândia, Islândia e França. Na Califórnia (EUA), desde 2018 a cota de gênero obriga os conselhos das empresas de capital aberto a terem pelo menos uma diretora nomeada e duas mulheres conselheiras; e a partir de 2020, também exige um número mínimo de pessoas não brancas em seus conselhos.

A pesquisa IBGC “Análise da diversidade de gênero e raça de administradores e empregados das empresas de capital aberto”, divulgada em 2024, mostrou que das 394 empresas analisadas, 82,7% têm alguma mulher atuando em órgãos da administração. Porém, dos 6.323 cargos na administração analisados, apenas 15,8% são ocupados por mulheres; 67,0% têm mulheres no conselho de administração e 42,4% têm mulheres atuando apenas na diretoria.

Os números nos mostram que a conversa precisa subir para a mesa, sair dos corredores, do paralelo, e ter uma intenção. Todos os anos o Dia Internacional da Mulher nos lembra de parar e refletir. Tenho lido uma escritora e ativista antirracista norte-americana, chamada Bell Hooks, que propõe “existe poder em olhar”. Mais ainda em agir...

Neste Dia Internacional das Mulheres, que possamos “olhar” para a baixa participação feminina em espaços de decisão não apenas como um “problema das mulheres”, mas um déficit democrático que afeta toda a sociedade: enquanto metade da população “não tiver voz”, perderemos ideias, soluções e talentos essenciais para enfrentar os desafios do século 21. Juntos vamos muito mais longe, logo, convido cada um de vocês, homens e mulheres, a trabalhar cotidianamente - e não apenas no mês de março - para mudar essa realidade!

 

*Cristhiane Brandão é conselheira de Administração, consultora em Governança para empresas familiares e vice-coordenadora-geral do Núcleo Centro Oeste do IBGC.

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