Um pedido de vista adiou o julgamento do pedido de intervenção na Saúde de Cuiabá. O desembargador Rubens de Oliveira alegou que se trata de um tema complexo e de um processo extenso, que exige mais análise e cautela. O caso estava sendo analisado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) nesta tarde de quinta-feira, 23 de fevereiro.
Depois de Oliveira fazer seu requerimento, o desembargador Juvenal Pereira pediu vista compartilhada do processo.
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O pedido dos dois magistrados foi registrado após o relator do processo, desembargador Orlando Perri, fazer a leitura de seu voto, favorável ao pedido de intervenção, ajuizado pelo Ministério Público do Estado (MP-MT), devido a uma série de irregularidades na Saúde Pública de Cuiabá.
Os votos estão sendo registrados nominalmente. Além dos dois pedidos de vista e o parecer de Perri, o desembargador Rui Ramos votou por acompanhar o relator.
Os desembargadores Carlos Alberto Alves da Rocha, Maria Erotides e Paulo da Cunha também acompanharam o relator.
Deixaram para votar após o pedido de vista os desembargadores Antonia Siqueira, Guiomar Teodoro Borges, João Ferreira Filho, Márcio Vidal e Serly Marcondes Alves.
O JULGAMENTO
Durante o período de sustentações orais, o procurador-geral de Justiça, Deosdete Cruz Junior, defendeu a intervenção na Saúde pública da capital. Ele reforçou que o órgão foi provocado pelo Sindicato dos Médicos, que apontou descumprimento de decisões judiciais, entre eles, a realização de concurso público e divulgação da escala de médicos no portal do município.
Ele ainda destacou que depoimentos de médicos também contribuíram para o pedido.
O procurador-geral adjunto, Alisson Akerley, alegou que o Município atendeu a decisão que pediu a realização do concurso no último mês, que já está em fase de homologação do resultado final.
Ele ainda destacou que nos últimos anos houve uma evolução na prestação de serviços na Saúde, ressaltando que 41% dos atendimentos feitos são de pacientes que vem do interior do estado. Apesar disso, o Município não estaria recebendo os recursos a que tem direito por parte do Governo do Estado.
Alisson ainda disse que a falta de medicamentos é um problema de de nível nacional e alegou que a prefeitura tem elaborado um plano de ação de providências para solucionar o problema.
Ele, por fim, sugeriu uma mesa redonda de conciliação com todos os atores ao invés de uma intervenção.
VOTO DO RELATOR
O desembargador Orlando Perri destacou que em 2013, o Município firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para realizar concursos na área da Saúde. No entanto, o certame só foi realizado cerca de 10 anos depois, após a proposta de ação de intervenção ter sido protocolada no judiciário.
Ele ainda comentou que embora tenha realizado o concurso, a prefeitura excluiu vagas para médicos clínicos gerais e de cirurgias gerais, o que, em sua avaliação, não cumpre integralmente a decisão.
O desembargador também mencionou que o Município chegou a atender algumas decisões, como não realizar contratação de profissionais sem concurso público e cumprir os repasses que estavam atrasados a hospitais filantrópicos.
Perri ainda disse que em 2021, Cuiabá recebeu da União R$ 421 milhões, mas gastou R$ 127 milhões. No ano seguinte, o Município teve R$ 364 milhões, mas usou 39% do recurso, apontando que durante o período da pandemia houve “derrame de dinheiro público nunca visto na história”.
Este último dado foi citado pelo desembargador para esclarecer que, mesmo com o alto repasse de valores, o Município deixou de investir na pasta, permitindo que a Saúde Pública permanecesse no caos.
Ele ainda apontou uma vistoria feita pelos Conselhos estadual e federal da Farmácia, que encontrou mais de 5 milhões de medicamentos vencidos no Centro de Distribuição. Perri comentou ainda que o Município não se preocupou em justificar em sua manifestação as razões para deixar vencer essa quantidade de medicamentos.
O magistrado ainda pontuou que o Município alegou não ter iniciado o processo de licitação porque aguarda uma recomendação do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT) acerca do caso, para só então incinerar os medicamentos vencidos.
"A justificativa para o atraso [na destruição e na compra de novos medicamentos] não apaga o pecado", disparou o desembargador.
Outro fator mencionado por Perri diz respeito a vários ofícios de médicos pedindo aos diretores de unidades a aquisição urgente de insumos básicos, como medicamentos, esparadrapo, agulha, atadura, sedativos e antibióticos. Por fim, o desembargador votou procedente o pedido e determinou que o período de intervenção deve durar por 90 dias, podendo ser prorrogado.
PRIMEIRA INTERVENÇÃO
A Saúde Pública chegou a ser alvo de intervenção em dezembro do ano passado. Na época, o desembargador Orlando Perri, de forma monocrática, acolheu o pedido do MP e destinou o Estado de Mato Grosso como interventor da pasta. No entanto, o procedimento durou apenas 7 dias, porque a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Maria Thereza de Assis Moura, determinou a suspensão da intervenção até que o processo seja decidido pela turma colegiada do Tribunal e não monocraticamente.
TROCA DE ACUSAÇÕES
O período de intervenção na Secretaria serviu para esquentar ainda mais a briga entre o governador Mauro Mendes e o prefeito Emanuel Pinheiro (MDB). Por parte do Gabinete de Intervenção, investigações apontaram uma série de irregularidades, como um rombo financeiro na ordem de R$ 350 milhões, além de medicamentos vencidos, dívidas com fornecedores, atrasos salariais de profissionais de saúde e inchaço de cargos comissionados.
Já a Prefeitura de Cuiabá, quando retomou a administração da pasta, acusou o Governo de extraviar 26 computadores, junto com 4 NVRs (gravadores de imagens), 1 Analizer (firewall), vários HDs e do sistema de gravação de segurança da Secretaria Municipal de Saúde.
O Governo anunciou a devolução dos equipamentos após passarem por perícia da Politec (Perícia Oficial e Identificação Técnica).
Em meio a essa confusão, o prefeito Emanuel chegou a comparar a confusão registrada na saída dos membros da intervenção da pasta com os atos golpistas de 8 de janeiro, quando milhares de bolsonaristas invadiram as sedes dos Três Poderes em Brasília defendendo golpe de Estado. Para Emanuel, Mauro agiu de forma golpista para perseguir e macular sua gestão.
O prefeito chegou a anunciar uma série de medidas contra a equipe interventora, como recurso na Justiça para que comprovem o rombo de mais de R$ 350 milhões na Saúde, anulação de todos os decretos e atos normativos editados pelo gabinete de intervenção, incluindo as nomeações e exonerações de servidores, além da estabilidade concedida aos indicados pelo Estado para o período pós-intervenção.
Emanuel também pediu ao presidente da Câmara Municipal de Cuiabá, vereador Chico 2000 (PL), que apure eventual desvio de finalidade, uso político e excesso de atos de gestão praticados pelos membros integrantes do gabinete.