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Opinião Quinta-feira, 20 de Março de 2025, 06:20 - A | A

Quinta-feira, 20 de Março de 2025, 06h:20 - A | A

CLAITON CAVALCANTE

Não confunda solitude com solidão

Claiton Cavalcante*

Dias atrás escrevi um artigo cujo título era “Não sou antissocial, sou seletivo”. Modéstia parte, o artigo “mexeu” com os leitores, recebi várias críticas. Com efeito, o texto foi reconhecido ao ponto de ser publicado em diversos sites e jornais do país.

Em uma das críticas – construtiva é claro! – recebida de uma amiga e leitora, amiga essa que constantemente temos discussões acaloradas em razão de divergência de opiniões – discussões construtivas! – ela sugeriu que o artigo do “... sou antissocial, ...” tivesse continuação.

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De pronto, aceitei a sugestão e a amiga leitora com o objetivo de subsidiar o novo assunto, me enviou um, exemplar antigo, da Revista Superinteressante, edição 407, onde sugeriu a leitura da reportagem intitulada, “A explosão da solidão”.

Li a reportagem, de onze páginas, que por ser relativamente antiga é super atual. E percebi, que guardada as devidas proporções, o tema daquele meu artigo não estava totalmente “fora da casinha” como alguns disseram.

Ao realizar as duas leituras, depreendi que em muitas partes do texto da revista há um antagonismo de opiniões daquelas constantes do meu artigo. Por isso entendo, que a opinião contida no meu artigo não está totalmente errada como muitos leitores pregaram, assim como a opinião da renomada revista não está totalmente correta. O ponto de vista depende das circunstancias e acima de tudo de uma palavrinha que muitos confundem o significado, solitude.

Duas passagens na reportagem me chamaram a atenção, sem contar o caso do homem que ficou preso durante 29 anos.

Primeiro, quando o sociólogo José Machado trata da individualidade, afirmando que hoje em dia as casas se transformaram num refúgio da individualidade que reflete uma realidade contemporânea marcada pela explosão da solidão e que em um mundo cada vez mais conectado virtualmente, paradoxalmente, as interações presenciais parecem se tornar mais escassas.

Para esse entendimento deixo o seguinte ponto de reflexão: Será que essa individualidade mencionada pelo sociólogo é necessariamente um problema ou pode ser uma escolha consciente e benéfica?

E, segundo que é o posicionamento que mais me agrada, é quando o mesmo sociólogo português, explica que o tipo mais comum de moradia moderna é o apartamento, termo que, ironicamente, significa separação. Para o sociólogo, esse dado (morar em apartamento) reforça a noção de que a estrutura urbana contemporânea favorece o distanciamento social.

É diferente morar em casa ou apartamento. Em que pese, hoje em dia para morar em casa o morador também está restrito as regras condominiais, pior é morar em apartamento, pois embora possa proporcionar um ambiente teoricamente mais seguro, muitas vezes esse tipo de moradia promove o isolamento dos indivíduos.

E por falar em isolamento, minha amiga leitora e mentora desse texto, quando estávamos discutindo sobre o tema, proferiu a seguinte frase que chamou minha atenção, “Elevador de prédio é o lugar mais constrangedor que já vi na vida; os usuários são como famílias, mas não se conhecem.”

Dito isso, fica claro que novamente defenderei a opinião registrada no artigo “Não sou antissocial, sou seletivo”.

Pois bem, o texto da revista, enfatiza os impactos negativos do isolamento, mas ignora o fato de que estar sozinho de forma consciente e desejada, que é a solitude, pode ser benéfico e até necessário para o desenvolvimento pessoal.

Entendo que, em vez de tratar a individualidade como algo prejudicial, é preciso reconhecer que muitas pessoas escolhem se afastar de interações sociais superficiais para preservar sua saúde mental e emocional.

Além disso, a ideia de que a hiperconectividade deveria impedir a solidão parte do pressuposto de que a quantidade de interações determina sua qualidade. No entanto, pesquisas mostram que relações autênticas e significativas são mais importantes do que um grande número de contatos. Como exemplo, temos a teoria do “número de Dunbar”, que sugere que os seres humanos conseguem manter, no máximo, cerca de 150 relações sociais estáveis.

Adicionalmente, a seletividade social, longe de ser um sintoma de isolamento patológico, como muitos pensam ser, pode ser uma forma saudável de evitar relações desgastantes e manter um equilíbrio emocional.

Corroborando com meu entendimento sobre a seletividade, a teoria da “seletividade socioemocional” propõe que, à medida que as pessoas envelhecem e percebem o tempo de vida como mais limitado, elas tendem a priorizar relações sociais que lhes proporcionem maior significado e satisfação emocional, reduzindo interações consideradas superficiais ou menos gratificantes.

Além disso, o conceito de solidão como algo tido e dito prejudicial não considera as diferenças individuais. Enquanto algumas pessoas podem sofrer com o isolamento, outras encontram na solitude um espaço para reflexão, criatividade e autoconhecimento.

A casa e também o apartamento, que a reportagem descreve como um refúgio solitário, pode ser, na verdade, desde que possua o “cantinho da caverna”, um ambiente de conforto e liberdade, permitindo que o indivíduo se desconecte do excesso de estímulos, as vezes não agradáveis, da vida moderna.

Dessa forma, ao invés de tratar a solidão como um problema a ser erradicado, é fundamental reconhecer que a individualidade e a seletividade social são escolhas legítimas e, em muitos casos, benéficas. O pulo do gato não está em evitar a solidão a qualquer custo, mas sim em equilibrá-la com interações sociais verdadeiramente enriquecedoras e cheia de solitude.

 

*Claiton Cavalcante é membro da Academia Mato-Grossense de Ciências Contábeis e do Instituto dos Contadores do Brasil.

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