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Economia Domingo, 04 de Agosto de 2024, 06:59 - A | A

Domingo, 04 de Agosto de 2024, 06h:59 - A | A

REFORMA TRIBUTÁRIA

Economistas não veem prejuízo com "imposto do pecado"; empresário acha cobrança abusiva

Bruna Cardoso

Repórter | Estadão Mato Grosso

O Brasil deve implementar até 2027 o "Imposto do Pecado", uma medida que visa reduzir o consumo de produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como bebidas açucaradas, alcoólicas e cigarros. A expectativa do governo é arrecadar até R$ 2,6 bilhões anualmente, valor que deverá ser utilizado para cobrir parte dos custos do Sistema Único de Saúde (SUS) com o tratamento de doenças relacionadas ao consumo desses produtos, como obesidade, diabetes e hipertensão.

Uma das justificativas para a implementação do imposto é a quantidade de crianças obesas no Brasil. Segundo o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), em 2023, uma a cada sete crianças menores de 5 anos estava obesa, o que representa 14,2% das crianças brasileiras.  Além da obesidade infantil, o país também registrou um aumento nos casos de morte por câncer de pulmão. O Sistema de Informações do Ministério da Saúde (Sim) divulgou que, em 2022, 29.576 brasileiros perderam a vida devido ao câncer, mais que o dobro do registrado nos anos 2000 (14.717).

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As economistas Charline Dassow e Cláudia R. Heck, do Núcleo de Pesquisas Econômicas e Socioambientais da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Mato Grosso (NuPES/FE/UFMT), avaliam que o novo imposto deve desestimular o consumo de produtos considerados viciantes, já que os preços devem subir.

“Um estudo recente elaborado por pesquisadores do NuPES/FE/UFMT identificou que um aumento de 20% nos preços das bebidas açucaradas poderia reduzir as compras de sucos açucarados, refrigerantes, bebidas lácteas açucaradas e bebidas esportivas/energéticas para consumo domiciliar em cerca de 20%”, disseram as economistas, em entrevista ao Estadão Mato Grosso.

Charline e Cláudia apontam, ainda, que a introdução desse tipo de tributo poderia gerar uma receita fiscal de R$ 2,6 bilhões por ano, o que representa cerca de 75,4% do total dos gastos estimados do SUS em 2018 para o tratamento de obesidade, diabetes e hipertensão, segundo estudo realizado por técnicos do Ministério da Saúde (clique aqui para ler). Dessa forma, os valores arrecadados poderiam ser utilizados para incentivar uma vida mais saudável.

“A Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, mostrou que, entre 2002 e 2019, houve um aumento significativo nos casos de sobrepeso e obesidade entre adultos com 20 anos ou mais no Brasil. Em 2002, 43,3% (9,6%) dos homens e 43,2% (14,5%) das mulheres estavam com sobrepeso (obesos). Em 2019, esses percentuais subiram para 60% (22,8%) e 62,6% (30,2%) para homens e mulheres, respectivamente. Além das crescentes taxas de obesidade, o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados tem aumentado o risco de diversas doenças não transmissíveis (DNT), como diabetes tipo II, doenças cardiovasculares, hipertensão arterial e alguns tipos de câncer, entre outros”, destacam.

Do ponto de vista econômico, as especialistas explicam que ainda não há evidências de que o imposto sobre produtos prejudiciais causaria perda de empregos ou redução de salários. Isso porque as empresas que vendem esses produtos poderiam oferecer outras opções mais saudáveis.

“Um estudo recente publicado na Revista Food Policy apresentou evidências de que as políticas de aumento do imposto sobre bebidas açucaradas e as regulamentações sobre os rótulos frontais das embalagens introduzidas no Peru não resultaram em perda de empregos ou de salários, nem causaram crise no setor (Diaz et al., 2023). Segundo os autores, o emprego e os salários não foram afetados devido a substituições industriais e outras ações das indústrias afetadas por essas políticas”, afirmaram.

Para Gregório Ballarotti, sócio e diretor da Cervejaria Louvada, a justificativa de inibir o uso excessivo de álcool é válida, mas a criação de mais um imposto é considerada abusiva, pois o Brasil já tem uma carga tributária elevada.

“O consumo excessivo de álcool não deve ser incentivado e pode causar danos à saúde. Dito isso, vários outros alimentos e produtos consumidos em excesso também podem ser prejudiciais, o que poderia gerar uma discussão interminável”, disse em entrevista ao Estadão Mato Grosso.

Para o empresário, o governo decidiu seguir um modelo tributário que já foi aplicado com sucesso em vários países desenvolvidos. Porém, ele destaca que a elevada carga tributária brasileira cria entraves para o desenvolvimento do país.

“A cobrança excessiva de impostos, como ocorre no Brasil, prejudica o desenvolvimento da geração de empregos e, consequentemente, o ganho econômico das pessoas. Portanto, entendo que o governo precisa cobrar impostos, mas não de forma abusiva. De qualquer forma, não acredito que essa seja a melhor abordagem”, afirmou.

O governo ainda não anunciou qual será a alíquota que incidirá sobre os produtos com álcool, principais itens do portifólio da Louvada. Porém, Ballarotti já adianta que as margens do setor estão muito apertadas e que os impostos inevitavelmente serão repassados aos clientes, o que pode levar a uma grande queda no consumo.

Ele também informou que a marca já possui uma linha de cervejas sem álcool, lançada antes mesmo da discussão sobre o "Imposto do Pecado", devido ao aumento significativo no consumo desse tipo de produto. Além disso, há estudos para novos lançamentos deste tipo.

“O desenvolvimento de novos produtos é sempre uma prioridade para nós. Infelizmente, produtos com álcool serão taxados de qualquer maneira e não vejo como evitar isso. No entanto, o desenvolvimento de novos produtos pode atender às demandas dos consumidores, como cervejas sem álcool ou bebidas que substituam refrigerantes e tragam benefícios funcionais. Ainda vemos um grande potencial de crescimento no Brasil, apesar do possível aumento na carga tributária. Assim, mantemos nosso foco em oferecer uma cerveja de qualidade aos consumidores, enquanto permanecemos abertos a inovações”, concluiu.

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