Especialistas chamaram atenção para o problema de abastecimento de água no Pantanal, embora a área seja considerada a maior planície alagável do planeta. Os impactos da crise hídrica na região pantaneira foram tema de debate nesta quarta-feira (15) durante reunião virtual da comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha o combate às queimadas em biomas brasileiros.
Diretora da organização Mulheres em Ação no Pantanal, Áurea Garcia ressaltou a dificuldade de acesso à água potável por comunidades locais, embora muitos povos vivam cercados pela água. Ela salientou ser importante fortalecer o protagonismo dessas comunidades, como as quilombolas e indígenas, na governança de seus territórios. “Eles sabem das alternativas possíveis”, disse.
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Coordenadora da comissão, a deputada Professora Rosa Neide (PT-MT) garantiu que o conhecimento dessas populações será levado em consideração no relatório juntamente com o conhecimento científico.
Hidrelétricas e mineradoras
Rubem Mauro, representante do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Cuiabá, reforçou a dificuldade de abastecimento de água em alguns locais da região, como no município de Poconé (MT). Ele considera a ação do homem na região “catastrófica” e criticou a captação de água realizada pelas mineradoras, quando a prioridade deveria ser o abastecimento da população e dos animais.
Já Vicente Andreu, especialista em recursos hídricos, observou que as crises hídricas são acentuadas pela proliferação das usinas hidrelétricas. Ele sugere transformar os planos das bacias hidrográficas em lei, porque hoje eles são formulados, mas não têm força para ser implementados. Previstos pela Política Nacional de Recursos Hídricos, os planos são documentos que definem o planejamento do uso das águas de uma região. Além disso, ele sugere que a gestão dos planos seja mais participativa.
De acordo com Débora Calheiros, do Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas, atualmente existem 180 projetos de hidrelétricas nos rios formadores do Pantanal, sendo que 60 empreendimentos já estão instalados. Ela ressaltou a importância de se planejar o local de instalação para amenizar os impactos das hidrelétricas. Ela também chamou atenção para outro problema: a contaminação das águas por agrotóxicos.
Sala de acompanhamento
Superintendente de Operação e Eventos Críticos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), Joaquim Gondim Filho informou que o plano de recursos hídricos para a bacia hidrográfica do Rio Paraguai atualmente está sob análise do Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Ele afirmou ainda que a ANA vai manter uma “sala de acompanhamento” permanente para monitoramento da região do Pantanal, para atuar de maneira preventiva.
Segundo Joaquim, a agência instalou uma “sala de crise” para discutir medidas de repostas para a situação atual, mas disse que a crise pode se prolongar. A atual seca na região do Alto Paraguai, conforme ele, é considerada um evento “raro”, que não ocorria, com essa gravidade, desde a década de 60, quando houve um período de seca de cerca de dez anos.
Iniciativa política
Maicon Veber, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), informou que já houve enfraquecimento da massa de ar quente e seco na região do Pantanal, com chuvas pontuais em algumas áreas. Porém, as chuvas na primeira quinzena de outubro ainda estão abaixo da média prevista para o período, e as temperaturas estão acima da média. A previsão para os próximos 10 dias é de que haja aumento das chuvas na região central do Brasil, com chuvas regulares previstas para a segunda semana de novembro.
De acordo com Alberto Setzer, também do Inpe, os extremos climáticos estão se tornando mais comuns. Ele reiterou que 2020 é o pior ano, em termos de de queimadas na região do Pantanal, desde 1998 e que há décadas há tecnologia disponível para acompanhamento dos incêndios. “Se a gente já sabe onde e quando ocorrem os incêndios, se são mais intensos ou ou perigosos, o que está faltando? Não falta dado técnico, mas iniciativa institucional ou política para enfrentar a situação”, avaliou.
O deputado Nilto Tatto (PT-SP) disse que está claro que o Inpe já alertava sobre as secas. “O problema é a inação ou uma ação política propositada, a que a gente assiste no País inteiro, sob o ponto de vista das queimadas”, opinou. Para ele, é preciso apurar as responsabilidades pelo que chama de "inação por parte do governo federal". Essa também é a visão do deputado Ivan Valente. “O poder público não só é inepto, mas colabora na proteção das ações criminosas”, ressaltou, criticando especialmente o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Transporte de cargas
José Renato Fialho, superintendente de Desempenho, Desenvolvimento e Sustentabilidade da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), informou que a situação no Pantanal afeta também o transporte de cargas na região. Entre janeiro e agosto o transporte de cargas na hidrovia Paraguai-Paraná teve redução de 35%. Segundo ele, a hidrovia tem potencial grande, mas tem sido pouco aproveitada. Na hidrovia não há navegação de passageiros regular.