A dengue é uma doença infeciosa que acomete milhares de brasileiros e ainda preocupa autoridades de saúde pública. Nos primeiros dois meses deste ano, os casos de dengue tiveram aumento de 35,4% em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados do Ministério da Saúde. Foram 30 óbitos e 128.379 casos.
Mesmo com pesquisas há décadas, ainda não temos uma vacina eficiente como vimos para a Covid-19. Somente um imunizante está disponível no Brasil, mas apenas no mercado privado e com restrições de uso (entenda mais abaixo).
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Outra vacina aguarda a aprovação da Anvisa desde o ano passado e, além disso, o Instituto Butantan está desenvolvendo - com parceria internacional - um imunizante do tipo, há mais de 10 anos.
1.Dengvaxia, da Sanofi Pasteur
Atualmente, a única vacina contra a dengue disponível no Brasil é a Dengvaxia (a primeira que teve registro no mundo), fabricada pelo laboratório francês Sanofi Pasteur. O imunizante é vendido na rede privada na maior parte do Brasil e não está disponível no Programa Nacional de Imunizações, o PNI.
Segundo a fabricante, a vacina promove imunidade de longa duração para os quatro sorotipos da dengue, prevenindo aproximadamente 8 em cada 10 casos de dengue grave e com risco de hospitalização.
Os sorotipos são as diferentes linhagens de um patógeno, os organismos que causam doenças. No caso da dengue eles são chamados de arbovírus, ou seja, são normalmente transmitidos por mosquitos (o Aedes aegypti).
Quem pode tomar?
A Dengvaxia não é recomendada para quem nunca entrou em contato com o vírus da dengue. Essa é uma recomendação reforçada pela Anvisa e pela Organização Mundial de Saúde.
Isso ocorre porque estudos da própria fabricante indicaram que esses indivíduos soronegativos que tomaram a vacina apresentaram, em longo prazo, mais casos da forma grave da dengue, após uma infecção pela doença.
Assim, a vacina é indicada para indivíduos de 9 a 45 anos com infecção prévia por dengue e seu esquema de administração consiste em três doses, que devem ser intercaladas num intervalo de 6 meses.
Renato Kfouri, médico pediatra e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), explica que essa é uma vacina que mostrou um risco aumentado de complicações para as pessoas que não tiveram a doença antes de serem vacinadas.
A bula da Dengvaxia determina que seja realizado um teste laboratorial ou soroteste para descobrir se o futuro vacinado teve uma infecção prévia pela doença.
Para a professora Hillegonda Maria Novaes, que participou do grupo de trabalho da vacina da dengue que fez os estudos com as recomendações para a OMS, essa vacina desde o início foi considerada “problemática”.
“Condicionar uma vacina à realização de um teste anterior é muito complicado e muito caro, nenhuma vacina aprovada é assim. Um estudo de caso-controle realizado no Paraná chegou à conclusão que ela mostrou efetividade na prevenção da infecção e na evolução para casos graves para apenas um dos 4 sorotipos”, diz.
Atualmente, a farmacêutica, juntamente com a CTK Biotech, desenvolveu ainda um novo teste de diagnóstico rápido (TDR) para detectar infecções anteriores por dengue que já foi inclusive aprovado pela Anvisa.
Porém, como ressalta Alberto Chebabo, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, esse novo teste é uma ferramenta que facilita a aplicação somente daqueles que desejam se vacinar com a vacina, e não campanhas de vacinação em massa.
“Para campanhas de vacinação populacional fica muito complicado. Eu acho muito difícil que essa vacina possa participar do PNI, por exemplo. Mas, individualmente, na clínica privada, ajuda sim”, pontua Chebabo.
Como a vacina está disponível?
No Brasil, o único estado que chegou a disponibilizar o imunizante da Sanofi foi o Paraná. A campanha de vacinação contra a dengue foi ofertada para a população em 30 cidades do estado, no período de agosto de 2016 a setembro de 2017.
No ano de 2018, a vacina foi ofertada apenas para as pessoas que já haviam recebido a vacina nos anos anteriores, ou seja, somente para conclusão dos esquemas vacinais.
O g1 procurou a secretaria de saúde do Paraná para saber se o estado ainda planejava campanhas de vacinação contra a dengue, mas, segundo resposta do órgão, depois da recomendação da Anvisa, a secretaria disse que “ficou inviável” a continuidade da campanha, “uma vez que seria necessário a testagem sorológica prévia à vacinação”.
Assim, atualmente, a Dengvaxia está disponível somente no mercado privado de vacinação.
Por que não foi incluída no PNI?
Para Carla Domingues, epidemiologista e ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI), essa decisão do governo paranaense foi “precipitada”.
“Um programa de vacinação exitoso para enfrentar um problema de saúde pública como é o caso da dengue deve ser pensado nacionalmente e uma ação feita em apenas alguns municípios de um único estado não tem impacto na diminuição da carga da doença”, explica.
Na época, o Ministério da Saúde tinha se posicionado afirmando que não iria implantar a vacina até que houvesse mais dados para subsidiar a tomada de decisão.
“Portanto, a decisão do Ministério foi adequada, pois era necessário ter mais evidências para a inclusão da vacina no PNI”, acrescenta.
Domingues também aponta que, à época, tendo em vista que os dados de eficácia da vacina não eram elevados, era fundamental entender qual seria o comportamento da vacina após o seu uso na população, principalmente porque ela não apresentava eficácia para o tipo 2 da dengue.
O g1 também entrou em contato com o governo federal perguntando se há uma previsão de incorporação da Dengvaxia no PNI e quais os resultados do estudo de custo-efetividade realizado em 2018, mas não obteve resposta do Ministério da Saúde.
Em nota enviada ao g1, a Sanofi Pasteur informou que não há estudos clínicos sendo conduzidos pela empresa para a avaliar o uso da vacina em indivíduos sem infecção prévia por dengue.
“De acordo com o uso indicado em bula, bem como recomendações externas, a testagem e vacinação continua sendo a abordagem recomendada para o uso de Dengvaxia”, disse a fabricante.