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Polícia Terça-feira, 26 de Dezembro de 2023, 14:47 - A | A

Terça-feira, 26 de Dezembro de 2023, 14h:47 - A | A

ATRAÇÃO BANDIDA

Delegada relata a realidade das mulheres que são puxadas para o crime organizado

Muitas são obrigadas a fazer parte do crime organizado sob a pena de perderem suas vidas

Igor Guilherme

Repórter | Estadão Mato Grosso

Nas páginas do jornalismo policial é comum encontrar ocorrências de homens sendo presos pelos mais diversos crimes, sejam eles contra o patrimônio, como roubo, furto, estelionato, ou contra a sociedade, como é o caso do tráfico de drogas, da lesão corporal, homicídios. Muitos desses criminosos são membros das facções criminosas estabelecidas no estado e, além de destinarem suas vidas a uma carreira de fora-da-lei, esses homens também obrigam suas companheiras a essa mesma realidade, muitas vezes sob a pena de sofrerem violências e até de serem assassinadas.

A reportagem do Estadão Mato Grosso entrevistou a delegada Jannira Laranjeira, responsável pelo Plantão de Atendimento 24 Horas da Mulher, sobre o assunto. Conforme a delegada, é muito comum as mulheres serem puxadas contra a sua vontade para o mundo do crime organizado.

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Igor Guilherme | Estadão Mato Grosso

Jannira

 

“Ocorre que muitas vezes a mulher entrou para o mundo do crime em razão do seu companheiro. Ela é obrigada a levar a droga dentro do presídio. Ela é obrigada a buscar a droga lá na divisa do Brasil, né?! Nos países vizinhos. Então ela é usada dentro desse relacionamento, muitas vezes abusivo. E quando ela cai, ela não recebe visita. Quando ele está detido, ela é obrigada a ir visitar, a adentrar ao presídio, ao sistema prisional com drogas ou com qualquer ilícito, né? É celular, dinheiro, outras coisas mais”, contou a delegada.

Laranjeira explica que a partir do momento que a mulher toma ciência de toda a organização da quadrilha, de todas as formas de se conseguir dinheiro e das faces e nomes de outros bandidos, sair é praticamente impossível.

“Você entrou em uma organização criminosa. Para você sair, as mulheres que manifestam interesse de sair, é como decretar a sua morte, porque é a mesma coisa da mulher que manifesta o interesse de se afastar do seu agressor, do seu abusador, que diz a ela 'que se não for minha, não será de ninguém'. Então é a mesma coisa.”, descreveu Jannira.

Ao contrário dos homens, que ocupam posições de destaque nas organizações criminosas, as mulheres, segundo a delegada, ocupam as posições de menos prestígios e também realizam trabalhos mais perigosos, como iscas para roubos de carga e mulas do tráfico.

Além de ocuparem posições de baixo prestígio no crime organizado, as mulheres são submetidas a punições severas, principalmente por supostas traições contra seus parceiros, que muitas vezes estão presos. A delegada explicou que ao contrário da mulher, ao criminoso homem é permitida a traição e sem punições.

“Nesse mundo é permitida a traição por parte do homem, mas por parte da mulher... Ela é penalizada cortando o seu cabelo, raspando a sua cabeça ou levando um salve de lesão corporal. A surra. Eu já atendi aqui uma mulher que chegou toda lapidada, toda marcada, seu corpo... as costas, frente, pernas e nádegas. Ela não fala. Ela vem aqui, é trazida aqui porque pedem socorro, vai o Samu, vai a Polícia Militar ao local. Populares, né?! E ela é trazida comunidade policial, mas quem acionou não foi ela, quem acionou foi a população. E ela não vai abrir (queixa), ela não vai contar nunca (quem a agrediu), porque ela tem medo de morrer”, explica a delegada.

ROMANTIZAÇÃO DO CRIME

Um dos fatores, na visão da delegada, que favorece a perpetuação das mulheres no mundo do crime é a cultura de que homem para se relacionar com a mulher, tem que ser o homem com “H’’, homens “viris”, que se envolvem no crime organizado, que andam armados, ostentam grandes quantias em dinheiro e que bancam um status de vida luxuso.

“A nossa educação, a educação da mulher hoje no Brasil é de se relacionar com homens com “H”, homens, macho, homens alfas, né?! O que é o homem alfa? É aquele que responde, que retruca, que entra pelo mundo do crime, é aquele que... gosta da velocidade, aquele que porta uma arma de fogo, é aquele que enfrenta... não é aquele que chora, que abaixa cabeça, que prega o perdão, que fala que te ama, não é esse, então nós temos um perfil, né?! De relacionamento e de mulheres que se relacionam com esse tipo de homem (com H). E é justamente aí que elas são seduzidas, que elas se romantizam”, contou a delegada.

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